terça-feira, 22 de maio de 2012

Limites da Publicidade Notarial são debatidos em Seminário nacional em SP


Notários e magistrados debatem o confronto entre a publicidade notarial e a privacidade do cidadão. Enunciados serão divulgados para votação na internet.

A necessidade da construção de uma base legal para rever os limites da publicidade dos atos notariais em contraposição à privacidade, intimidade e segurança do cidadão que procura um Tabelionato de Notas para a prática de um ato que garanta segurança jurídica e previna litígios.

Esta foi a principal conclusão do I Seminário de Publicidade Notarial, promovido pelo Colégio Notarial do Brasil – Conselho Federal (CNB-CF), com apoio da seccional de São Paulo (CNB-SP) e da Associação dos Notários e Registradores do Estado de São Paulo (Anoreg-SP), realizado neste sábado (19.05), no hotel Pergamon, na cidade de São Paulo.

 
Juízes e notários debatem o tema da Publicidade Notarial

“Todos concordamos que há necessidade de maiores cuidados para a publicidade. O que se discute é a base legal para esta mudança”, sintetizou o desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP), Ricardo Henry Marques Dip, que palestrou sobre o tema. “A publicidade notarial está ordenada à res publica, não pode haver instituições parciais no País que se coloquem à margem do interesse do bem comum”, afirmou o desembargador. Em breve, o CNB divulgará em sua página na internet os enunciados sobre o tema, que serão submetidos à votação dos notários brasileiros.

Com a presença de Tabeliães de vários Estados, juízes e advogados, o encontro favoreceu o debate saudável entre a categoria e contou com a participação dos magistrados Walter Rocha Barone, Roberto Maia Filho, Luís Paulo Aliende Ribeiro, além do jurista Christiano Cassettari, e dos presidentes do CNB-CF, Ubiratan Pereira Guimarães, e da Anoreg-SP, Laura Vissotto.

O presidente do CNB-CF, Ubiratan Pereira Guimarães (à dir.) e o desembargador do TJ-SP, Ricardo Dip

Na abertura do evento, o presidente do CNB-CF, Ubiratan Pereira Guimarães, destacou a pertinência do tema e a necessidade de se chegar a conclusões e constituir alguns enunciados sobre a posição dos notários acerca dos limites da publicidade notarial. “Esse é um assunto que gerou muitas discussões em nossa classe, mas nós não havíamos ainda feito um encontro para debater exclusivamente o tema da publicidade, pelo menos no âmbito notarial”, argumentou Guimarães.

Já a presidente da Anoreg-SP, Laura Vissotto, saudou o Colégio Notarial do Brasil pela iniciativa. “É muito importante debatermos no âmbito das entidades os assuntos específicos de cada especialidade. Cabe à Anoreg-SP fazer a representatividade institucional e política da classe. Nós apoiamos esse evento e acreditamos que os debates serão muito ricos e trarão os resultados que a categoria clama há muito tempo”, enfatizou.

 
Seminário nacional reuniu Notários de vários Estados brasileiros

Publicidade Notarial versus Privacidade do Cidadão

Para o juiz Substituto de 2° Grau da 1ª Câmara de Direito Público de São Paulo, Luís Paulo Aliende Ribeiro “o cidadão busca a atividade notarial em busca do conselho e da confiança” e o cerne da questão consiste em saber “para que fim ele busca o ato notarial: para ser cumprido ou para se dar publicidade?”, indagou. Para o magistrado, “uma coisa é dizer se há ou não um determinado ato e outra é divulgar o conteúdo deste ato”. “Há interesse público, res publica na divulgação de um testamento de pessoa viva?”, indagou. “Ao divulgar o conteúdo de um testamento público o notário está cumprindo uma de suas premissas, que é a prevenção de litígios?”, questionou.

 
O juiz Substituto de 2° Grau do TJ-SP, Luís Paulo Aliende Ribeiro

Na mesma linha, o jurista Christiano Cassettari abordou o fenômeno da exposição dos dias atuais, onde o cidadão sofre constantes invasões de privacidade. Saudando as normatizações dos Estados do Paraná e do Rio Grande do Sul, que vedam o acesso a qualquer cidadão aos atos notariais de outros, enfatizou a necessidade de rever a normativa paulista que permite não só a divulgação do conteúdo testamentário, mas também as escrituras de inventários, divórcios, partilhas e separações, “autênticas mini declarações de imposto de renda”, assim como os dados de cpf e rg constantes na Central de Escrituras de Separações, Divórcios e Inventários (CESDI).

“A sociedade tem que saber que possui a mesma garantia de segurança e privacidade, tanto na área judicial como na extrajudicial”, argumentou. “Se o divórcio possui segredo no judicial, por que não possui no extrajudicial? Esta diferenciação, que no fim redundará em uma perda de confiança na atividade notarial e no consequente esvaziamento dos atos praticados, com migração para outros estados, vai na contramão do que previa a lei 11.441, que era desafogar o Poder Judiciário”, destacou Cassettari.

 
O advogado Christiano Cassettari (dir.)

Necessidade de alteração legislativa

Autor do Parecer da Corregedoria Geral de Justiça do Estado de São Paulo que permitiu com que o conteúdo testamentário fosse acessado por um terceiro, o juiz Substituto em 2º Grau do TJ-SP, Walter Rocha Barone, afirmou que ao proferir o parecer não desconsiderou o risco que o eventual acesso por terceiro de testamento alheio fosse causar, mas esbarrou na previsão legal, “baseada em considerável doutrina civilista”, que determina a publicidade dos atos notariais.

“A solução só pode ser legislativa”, destacou Barone. “O confronto entre o direito a intimidade versus a publicidade é muito tênue para se decidir no caso concreto e o ideal é que tenhamos regras objetivas e gerais sobre o tema”. O magistrado ainda destacou que concorda em que em alguns casos há a necessidade de se restringir o acesso a determinado atos, mas “deve haver uma regulamentação sobre o tema, não se podendo decidir por via administrativa”.

 
O juiz Substituto em 2º Grau do TJ-SP, Walter Rocha Barone

Na mesma linha, Roberto Maia Filho, juiz Substituto em 2º Grau do TJ-SP, elencou que o “direito à informação é uma conquista” e que o debate sobre o tema “envolve discussões sobre direitos fundamentais da pessoa”. Em seguida, elencou uma série de decisões sobre o tema, e destacou que a restrição à divulgação poderia estar relacionada somente à existência do ato e não a seu conteúdo. “No entanto, embora concordemos que há o excesso de exposição, há a necessidade de mudança legislativa para que se possa restringir o acesso aos atos notariais”.

Em seguida, os participantes do evento puderam debater os aspectos relacionados à publicidade notarial em confronto com a privacidade do cidadão. Para o 26° Tabelião de Notas de São Paulo, Paulo Gaiger Ferreira, “o notário descumpre o seu dever de sigilo profissional, previsto na lei 8935, em seu artigo 30, ao dar publicidade ao ato privado do cidadão, devendo inclusive ser punido por tal prática”.

Os participantes ainda debateram os limites de sigilo em escrituras que envolvam atos de separações, divórcios, inventários e partilhas, particularmente no que se refere aos direitos de terceiros que podem ser envolvidos nesta restrição. A autonomia do Tabelião em decidir pela publicidade ou não de determinado ato e a autorização da parte para que se possa dar publicidade a determinado ato notarial também foram abordadas.

 
O juiz Substituto em 2º Grau do TJ-SP, Roberto Maia Filho (ao centro), o 26º Tabelião de Notas, Paulo Gaiger (à esq.) e o juiz Substituto do TJ-SP, Walter Barone Rocha

“Limite está na privacidade de outra pessoa”, diz desembargador Ricardo Dip

Autor do livro “Prudência Notarial”, que deverá ser lançado em breve, o desembargador Ricardo Dip iniciou sua explanação citando as referências da função clássica do notariado: verificação da identidade e capacidade dos outorgantes, aconselhamento e assessoramento jurídico, formalização dos atos, conservação dos documentos e garantia do conhecimento dos atos, sendo que este último tópico diz respeito à publicidade notarial.

O palestrante falou sobre o sentido denotativo da palavra publicidade que, segundo explicou, possui mais de um significado, sendo que o “usus loquendi” predominante, isto é, o uso corrente da palavra no cotidiano é no sentido de difusão, como mostra o adjetivo latino “publicare” que significa “tornar público”, por à disposição do povo. “A palavra publicidade possui mais de um significado e a dominância de um desses sentidos na linguagem comum não significa menor importância histórica das demais acepções dessa palavra”, definiu.

 
O desembargador Ricardo Henry Marques Dip durante explanação no Seminário Notarial

O desembargador abordou ainda o sentido quantitativo da palavra publicidade, que deriva de “pubes” e equivale a maduro/adulto; e sobre o sentido qualitativo. “Não é qualquer coisa que efetivamente preenche os requisitos da publicidade tal qual ela deve ser: madura para o sentido original”, enfatizou, citando como exemplo a fofoca, a intriga, a calúnia e a maledicência, que são tipos de publicidade, mas sem a maturidade necessária e, em alguns casos, com aspecto criminal. “A publicidade é, no mínimo, análoga”, afirmou.

Levando a plateia a se aprofundar no tema, o desembargador Dip relacionou a publicidade notarial com a res publica (bem comum), em que o limite está na privacidade da outra pessoa. Ele abordou o sentido de investidura, de documentabilidade, expressibilidade (instrumento de informação), compreensibilidade, acessibilidade ou suscetibilidade de adquirir direitos, e sentido de bem comum ou bem geral. “O que eu quero extrair desta reflexão é que a publicidade notarial está ordenada à res publica, não pode ser de outro modo, não pode haver instituições parciais no País que se coloquem à margem do interesse do bem comum.”

 
Encontro favoreceu o debate saudável entre participantes do Seminário nacional

Citando a Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527), Dip abordou o uso dos meios tecnológicos e mostrou os aspectos em que a publicidade acompanha a vida das pessoas, como na difusão de fotos pessoais pela internet, na instalação de câmeras em locais públicos, na exposição na mídia e nos rastros deixados na internet. Falou ainda sobre o direito ao esquecimento e à privacidade das informações patrimoniais, da saúde e sobre o intelecto. Segundo ele, a sociedade corre o risco de “destruição por excesso de informação” e finalizou sua exposição com o questionamento sobre qual tipo de sociedade queremos. “Precisamos formar mais ciência e mais consciência dos deveres morais”, declarou. “Eu confio no notariado brasileiro.”
fonte: http://www.notariado.org.br/#/1

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